Construindo uma relação de confiança com os filhos
Se o seu filho adolescente já pediu para você parar o carro na esquina da escola, longe do olhar dos colegas, recusou-se a viajar com a família ou a participar de um almoço dominical na casa dos avós, você já sentiu na pele que não tem mais conhecimento sobre todos os passos do indivíduo que colocou no mundo, pois ele cresceu.
Na adolescência, os filhos costumam se afastar do núcleo familiar, pois descobrem sua individualidade, querem explorar novos universos e, para isso, precisam estar sozinhos. Apesar de situações difíceis de serem administradas pelos pais –assombrados pelo medo de que algo ruim aconteça–, enveredar pelo caminho da vigilância exagerada em nada contribui para que os dois lados atravessem essa fase.
É natural que os pais estranhem e, muitas vezes, não saibam lidar com essa nova situação. “Os adolescentes se afastam dos pais porque eles descobrem um outro lado dentro deles. Têm pensamentos, sensações e sentimentos desconhecidos. Há, também, a questão hormonal. Por isso, é uma fase marcada por solidão”, afirma Miguel Perosa, professor de psicologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
Alarmados pela falta de controle, muitos pais utilizam métodos pouco recomendáveis, como investigar a vida do filho, seja pela internet, mexendo no celular, na mochila, nos armários e até os seguindo na rua. “Isso de nada adianta e, além de gerar grande ansiedade e uma certa neurose nos pais, acaba quebrando a confiança por parte dos filhos.”
Segundo Perosa, não há motivo para bancar o detetive. “Os pais têm a fantasia do controle absoluto e imaginam que os filhos escondem algo deles. Isso acontece porque a relação é de desconfiança de ambos os lados. Os adultos têm todo o controle quando os filhos são crianças. Depois, esse poder diminui muito”, diz o psicólogo.
Uma boa conversa
É preciso ouvir mais e falar menos. Os pais precisam entender o significado do silêncio do filho; saber discernir se é uma reclusão, porque o adolescente quer compreender sozinho o que se passa com ele, ou se é uma dificuldade de comunicação. “O fundamental é conversar. O diálogo é a melhor solução, mas sem criticar ou julgar”, diz o psicólogo Miguel Perosa.
Evitar a vigilância exagerada não significa deixar de acompanhar o que se passa com seu filho. Adolescentes não toleram o que costumam chamar de invasão de privacidade. Saber que os pais estão bisbilhotando suas coisas faz o jovem se sentir desrespeitado, e ele se afasta.
Um exemplo: não vasculhe a bolsa da sua filha, pois as chances de você encontrar um preservativo existem –o que tem seu lado positivo, dependendo da idade. Para não levar sustos nem construir uma relação de desconfiança, o melhor é conversar, sempre. Fale sobre sexualidade e pergunte se ela quer ir a um ginecologista. Assim como sexo, muitos outros assuntos devem ser abordados: drogas, tatuagem, piercing, baladas, namoro etc.
Valores da infância
A adolescência é a fase da experimentação e das pequenas transgressões. Os jovens precisam errar para aprender e os pais não precisam saber de tudo. “Se o ambiente em casa é tranquilo, o relacionamento é aberto, a tendência é que os adolescentes conversem com os adultos”, afirma o psicólogo Antonio Carlos Amador Pereira, também da PUC-SP. Mas, mesmo assim, há coisas que eles não contam, pois preferem ter sua intimidade preservada ou dividir certos assuntos com amigos.
A educação dada pelos pais desde a infância mostrará os resultados na adolescência. “Se eles souberam passar valores básicos, como moral, ética, respeito, honestidade, responsabilidade, os jovens os terão em mente para sempre e, assim, capacidade de julgar o que é bom ou não”, diz Pereira.
Não perca a autoridade
É claro que os perigos existem e os pais precisam observar e orientar os filhos adolescentes. Os sinais de que há algo errado podem ser muitos: mudanças repentinas de comportamento sempre merecem atenção e uma avaliação mais profunda.
De acordo com a psicóloga Marina Vasconcellos, do Instituto Sedes Sapientiae e da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), é fundamental que o adolescente tenha consciência do afeto dos pais e de que pode contar com eles, mas sem confundir os papéis. Apesar de compreensivos e respeitadores do espaço do adolescente, eles têm uma autoridade, que não pode ser questionada ou ameaçada.
“Chega uma hora em que os pais têm de fazer valer as regras e dizer: desliga o computador, vá dormir, tem de estudar. É isso e ponto final. Não adianta querer quebrar essa autoridade e fazer o papel de bonzinho o tempo todo. O adolescente precisa de compreensão, mas de mão firme também.”